Terça, 14 Novembro 2017 01:24

Rapper e apresentadora Karol Conka fala de sua trajetória, de preconceito e seu jeito de levar a vida

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Karoline dos Santos Oliveira uniu o mundo Pop aos ritmos do Rap e cantou aquilo que muitas mulheres pobres e negras queriam gritar. Nascida no gueto curitibano, agora ela é Karol Conka, a nova diva brasileira. A rapper mais famosa do Brasil é a personagem de várias capas de revistas como da Rolling Stones, por exemplo, e tantas outras, além de sites e portais que circulam por aí, além de receber convites para participar de vários programas de televisão.

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Karol, 31, é a primeira rapper a comandar uma atração dedicada à beleza.Com seus cabelos coloridos e looks descolados, cheios de personalidade, ela foge completamente dos padrões ditados pela TV e representa uma revolução no quesito diversidade, algo que ela vê de maneira muito positiva.

Em 2003, aos 16 anos, ganhou um concurso de rap em Curitiba, sua cidade natal. Aos 17, começou a colocar suas músicas na internet e a gravar com outros rappers. Em 2013, lançou seu primeiro álbum solo, chamado Batuk Freak, com a proposta de mesclar o rap a outros ritmos, como eletrônico, funk, dubstep, reggae, r&b, soul e repente. E finalmente, no ano seguinte, a cantora explodiu com o hit “Tombei”.

Em 13 de março de 2016, um mar de gente preencheu cada metro quadrado do gramado do Autódromo de Interlagos diante do palco Trident at Perry’s, no Lollapalooza. Todos aguardavam ansiosamente pela aparição de uma única pessoa para, então, começar a pular. Quando Karol Conka surgiu no palco marcando presença com seu figurino (ela adora rosa, roxo, lilás, pink – inclusive nos cabelos), sua voz e suas batidas, a plateia entrou em transe. Em um horário medíocre, 13h30 da tarde, ela fez o palco de música eletrônica de um dos maiores festivais sonoros do Brasil lotar. E fez um show memorável, talvez o mais marcante de sua trajetória até hoje, segundo ela própria.

Sua ascensão na música abriu caminho para outras áreas. Agora, além de cantar, ela apresenta o programa “Superbonita”, no canal GNT. Karol nasceu e cresceu no Boqueirão, bairro periférico da cidade de Curitiba. Não à toa, as letras de suas músicas, desde o início, tratam de questões sociais, como o preconceito racial, a desigualdade de classe e, principalmente, a desigualdade de gênero. Embora sua música esteja carregada de crítica nas letras, as batidas são alegres e dançantes. Isso é tática, ela explica. “Ao invés de falar dos problemas sociais em uma batida quadrada, contando coisas de um jeito chato que ninguém ouvirá, prefiro fazer uma produção diferente, pegando palavras chave e mensagens carregadas de ‘punchlines’. Isso atrai a atenção das pessoas”, conclui.

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“Minha avó  me ensinou que mulher, por ser mulher, tem que provar as coisas duas vezes e que eu, por ser negra, tinha que provar três. Ela dizia que, se não nos impormos, se não falarmos um pouco mais alto, nós nunca seremos levadas a sério”, explica.

Para Karol, esse jeito combativo de ser tomou espaço nos seus 14 anos, com o falecimento de seu pai. Até então, Odair era o principal protetor da filha. “Ele me defendia muito. Quando ele se foi, o que eu mais pensava era ‘putz, e agora?!’”. Mas, além de defensor, ele era alcoólatra. E este era um dos motivos pelos quais os colegas de escola tiravam sarro de Karol. Quando ele faleceu, a menina sabia que, assim que pisasse na escola, os garotos fariam piadas sobre a morte de Odair. Nesse dia, ela concluiu algo importante: “Se eu não for maior que eles, eu vou continuar sendo menor”. E foi aí que a adolescente Karoline relembrou os ensinamentos da avó e percebeu que poderia enfrentar os colegas de escola. “Eu acabava apanhando, levando uns chutes, mas eu não chorava, porque o que eles queriam era me ver chorar, sucumbir. Quando eu vi que esta era a intenção, foi aí que passei a ser quem eu sou hoje” - com relação a esse bullying baseado em preconceitos, ela faz questão de reforçar que acontecia principalmente na escola. “Lá no Boqueirão, onde cresci, às vezes eu nem lembrava que eu era negra” – mesmo sua família sendo uma das duas únicas famílias de negros do bairro.

Em Coletiva de Imprensa da Bayer, realizada no último dia 22 de novembro  "Bayer & Saúde da Mulher", uma Mesa Redonda com os médicos Dr. José Bento, Dr. Cesar Fernandes, a psicanalista e escritora Regina Navarro, a atriz e apresentadora Fernanda Souza e a cantora Karol Conka, mediada por Paulo Pereira que ela explicou que busca desmistificar uma série de tabus intocados por grande parte da sociedade, além das críticas sociais. Sem papas na língua, um de seus últimos lançamentos foi “Lálá”, música que fala sobre a falta de experiência dos homens com a prática de sexo oral em mulheres. “Eu sempre fui muito direta com as coisas que eu quero falar, que é para não deixar dúvida”. Confira mais algumas coisas que vem acontecendo com esta sonhadora que tem realizado muitos de seus sonhos.

Universo de Rose – E você cantora, foi parar na televisão como apresentadora do Superbonita desde março (exibido às segundas-feiras, às 21h, no GNT). Como foi isso pra você, Karol?

Karol Conka – Estou me sentindo à vontade na posição e o maior desafio é manter minhas   opiniões neutras durante as gravações. Trouxe o meu discurso empoderado para o programa, porque ele tem uma estética nova, é trabalhado em cima das minhas canções. Cada tema do Superbonita foi tirado de letras das minhas músicas do álbum Batuk Freak. Além de falar com personalidades, celebridades, também vou às ruas falar com anônimos e desconstruir estereótipos. Sempre quis ser apresentadora, desde pequena. Quando era criança fazia perguntas pra mim mesma - a louca! (risos). Sempre joguei para o universo ‘um dia vou ser apresentadora’ e ele devolveu.

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UR – Como você encara o Superbonita?

KC – Encaro como uma missão. Existem pessoas adoecendo com a falta desses temas na sociedade. Temos que levar palavras de conforto para elas, porque na escola a gente não aprende autoestima. O que mais me motivou a participar do Superbonita nessa temporada foi o fato do programa propor uma reeducação comportamental, explorando um conceito de beleza que já não é mais o mesmo. Esse programa vem com o conceito de libertação da sua própria beleza. Você não precisa seguir um padrão de estética para se sentir bem e o programa reúne vários estilos que mostram isso.

UR – Existem muitos estilos diferentes no mundo das mulheres “Superbonitas”?

KC – Sim, é uma mudança comportamental que rola não só no Brasil, mas no mundo inteiro. É uma reeducação cultural mesmo. Nosso programa vem com a libertação da sua própria beleza. Você é “Superbonita’ da sua maneira, não precisa seguir um padrão para se enquadrar. Quando convidada desde o final de 2016 para substituir Ivete Sangalo na função, admito que fiquei emocionada com a proposta.

UR – Qual sua fonte de Inspiração?

KC – Os temas abordados têm tudo a ver comigo, saíram das minhas músicas. Acho importante a preocupação de passar essa mensagem e acompanhar a reeducação cultural brasileira. Outra novidade do programa é que cada episódio conta com a participação de uma Youtuber, como Jout Jout, por exemplo. Elas vão falar sobre o tema do dia e, de quebra, compartilhar um dos seus truques de beleza. Acho fantástica a fusão da web com a televisão. As pessoas conseguem absorver informações rapidamente dessa forma. Não há razão para não estarem juntas, afirma.

UR – Como você se cuida, Karol? Tem medo de envelhecer?

KC – Olha, com 1,65 m de altura e 53 kg, me cuido com alimentação simples: Minha dieta é tomar cerveja de trigo (risos), comer melão... como de tudo, mas não tomo refrigerante, sorvete nem requeijão, sempre com equilíbrio.  Eu não temo o efeito do tempo, não tenho medo de envelhecer. Qualquer coisa boto um botox.(risos).

UR – E os cuidados com o cabelo, que cada dia tem um penteado e uma cor diferente?  

KC – (risos) Gosto de passar vitamina. Para dormir, faço um “coquinho” quando estão compridos e uso spray de boa qualidade pra não quebrar. Passei 11 anos alisando o cabelo. Só parei quando conheci o rap, aos 16. Me senti mais livre, mais negra, muito mais bonita com o cabelo crespo, afro. Mas alisar o cabelo não diminui a negritude de ninguém. É uma questão estética. Se ela está bem consigo mesma, quem sou eu pra julgar uma negra que alisa o cabelo?

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UR – O que é ser Superbonita pra você?

KC – Ser Superbonita  é ser feliz consigo mesmo. O que nem sempre é fácil, já que todo mundo passa por uma fase de questionamentos em relação ao próprio corpo e à autoestima. Por exemplo, enfrentei um período difícil durante a gravidez, com apenas 19 anos. Estava me sentindo mal, me sentindo feia, porque não estava enquadrada nos padrões de beleza, com o corpo cheio de estrias, pois sofri com a depressão pós-parto. Só depois vi que tinha outras coisas mais bonitas e aí que me enquadrei na arte.

UR – O que a maternidade representa pra você?

KC – Engravidei aos 19 anos e na época foi um susto, quis morrer. Minha mãe me dizia “você tem um filho, e eu que na sua idade tinha dois filhos e um marido bêbado?”. Naquele momento, achava que ter um filho me impediria de ser quem eu quisesse. Eu me sentia menos porque engravidei tendo informação dentro de casa e porque engravidei cedo. Eu me sentia menos porque não quis mais ficar com o pai da criança e então eu seria uma mãe solteira.  Hoje, ao contrário, enxergo como a maternidade foi importante naquela fase. Meu amado filho, Jorge, já está com onze anos e é minha principal fonte de energia. Tudo que eu faço, a força para executar, vem do Jorge. Procuro sempre fazer as coisas e cuidar do meu eu para que ele tenha orgulho de mim. A maternidade me fez muito bem, sem meu filho eu não sei como estaria minha cabeça hoje.

UR – Brincadeira rápida: Karol no passado, presente e futuro?

KC – A minha versão de 19 anos diria para a Karol de hoje. “Você é muito louca”, na lata. E o que a Karol de hoje diria para a de 60 anos: “A senhora arrasa!”. Eu creio que aos 60 anos estarei maravilhosa, com um cabelo grisalho, meio lilás, e que já terei conseguido criar um império na minha família. Sempre estive bem comigo mesma porque aprendi com a minha mãe a me posicionar como “uma mulher guerreira, de fibra e muito bem resolvida”. E quando completei meus atuais 31 anos, me senti  mais linda, maravilhosa, poderosa, negrificada, bombástica (risos). Sempre fui convencida, metida, tudo que é ‘ida’ (gargalhada). Acho que é por causa da minha família. Meu pai e minha mãe sempre me elogiavam.

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Rosângela Cianci

Jornalista, repórter, palestrante, apresentadora, produtora de TV, idealizadora do site Universo de Rose. Incansável observadora do cotidiano, sou apaixonada pelo que faço. Ex-Secretária Executiva, sempre lidei com Diretoria e Presidência, mas, prestes a completar Bodas de Prata na área, resolvi desengavetar um sonho antigo: o Jornalismo. E parti pra nova luta com 40 (e uns anos), pois meu negócio é escrever e conversar sobre assuntos de A a Z...

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